Enfim, o Banco Central americano iniciou o mundialmente aguardado ciclo de cortes de juros. Não houve surpresa em relação ao início do processo, mas a magnitude não foi exatamente a esperada. O mercado financeiro acreditava em um corte de 0,25% na taxa básica. Entretanto, a escolha do comitê foi por uma redução de 0,5%, sendo considerada um movimento “audacioso” por parte da autoridade monetária.
A preocupação em relação à magnitude reside nos indicadores macroeconômicos. A atividade econômica segue aquecida, mesmo com inflação e mercado de trabalho apresentando melhoras marginais em suas recentes leituras, evidenciando toda a sua força e sua resiliência em meio a um cenário de política monetária ainda no campo restritivo.
Todavia, a eterna vigilância será fundamental nesse processo. Eventos como a greve dos portuários que reivindicam 80% de aumento salarial e a última leitura do JOLTs (que mede o número de vagas abertas e o saldo entre contratações e demissões) acima do esperado, servem de alerta para sustentabilidade do ciclo de cortes. Ritmo e magnitude seguirão dependentes de como toda a dinâmica da principal econômica mundial irá reagir. Somente o tempo e, principalmente, os dados conseguirão estabelecer o fim dessa jornada.
Oriente Médio volta a ser motivo de preocupação nos mercados devido ao recente movimento de Israel no tabuleiro geopolítico da região. Com uma série de ofensivas significativas em vários fronts, o país eleva o tom nas disputas com o Hamas na Faixa de Gaza, com o Hezbollah no Líbano e, recentemente, com o Irã. O conflito em si não é a principal fonte de preocupação, mas a rapidez com que ele vem se intensificando é o que de fato assusta. A execução de lideranças do Hamas e do Hezbollah acirraram os ânimos e a diplomacia, ao que tudo indica, não está conseguindo coordenar as ações para restaurar a “normalidade” na região. Uma resolução pacífica é considerada inviável.
Caso o cenário siga deteriorando, as consequências podem ser significativas, mesmo para quem não está diretamente ligado ao acontecimento. Localizados em uma região estratégica na teia logística e produtiva (principalmente de petróleo), os países envolvidos podem causar, em escala global, uma quebra na cadeia produtiva e comercial, com impactos relevantes nos preços de bens e commodities, cenário semelhante ao que vivenciamos recentemente na pandemia.
Desde o primeiro semestre de 2023, o mercado brasileiro esperava pelo início do ciclo de cortes de juros nos EUA. A importância desse movimento é significativa, haja vista que uma alteração no fluxo de capitais procurando opções mais rentáveis é esperada, sendo o Brasil um destino bastante relevante no prospecto de opções do investidor global.
Iniciamos o ano passado de forma promissora. Uma combinação de fatores oxigenou o ânimo dos investidores. A retomada da economia chinesa, o preço das commodities em patamares atrativos, governo federal propondo uma nova regra fiscal e a inflação convergindo para a meta. As bases para que o Brasil fosse um destino do investidor internacional na busca por rentabilidades mais atrativas estavam sendo construídas. Parecia, que dessa vez, íamos soltar as amarras que seguravam boom do nosso mercado.
Entretanto, a economia americana tratou de colocar “água no nosso chopp”. A resiliência da atividade surpreendeu, deixando o FED “passageiro” de sua estratégia de sinalizar que havia chegado no fim do ciclo de alta sem que a inflação tivesse chagado no patamar desejado. Sendo assim, ficamos data dependent (dependente dos dados) da maior economia do mundo, nos colocando, por consequência, em compasso de espera. E nós esperamos… Com a boa e bem conhecida persistência brasileira. Depois de mais de um ano aguardando ansiosamente, o Banco Central americano iniciou o seu ciclo de cortes.
E o Brasil? O que fez enquanto esperava a convergência dos dados “lá fora”? Fizemos o contrário do que deveríamos. Infelizmente. Tratamos de enfraquecer os fundamentos que nos levaram a um elevado patamar de expectativas em 2023, principalmente no que tange as contas públicas e a troca do comando do Banco Central. As bases da estabilidade monetária foram afetadas. Quando a autoridade fiscal (Fazenda) e a autoridade monetária (Banco Central) não conseguem transmitir confiança e, principalmente, um alinhamento no horizonte a ser seguido, a consequência é a perda ou diminuição de credibilidade. Ao invés de buscarmos reforçar essas bases enquanto os dados americanos não vinham, fizemos o oposto. A recente subida de 0,25% na nossa taxa básica é consequência desse desarranjo entre as instituições e as consequências advindas dele. Sem os devidos ajustes, podemos perder mais uma oportunidade. De novo.
Desejamos ótimo outubro a todos!